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Téo Júnior*
FORÇA DA NATUREZA
Téo Júnior*
Classificado pela crítica
mais honesta como sendo o melhor teatrólogo norte-americano do século XX depois
de O’Neill, o dramaturgo Tennessee Williams teria feito cem anos no ano passado
se não tivesse morrido em 1983.
Williams extraiu de sua
vida atribulada e infeliz a matéria-prima que ganhou corpo nos palcos e o
projetou para o estrelato. Se no teatro brasileiro Dias Gomes evidenciou a
religião mesclada às nuances políticas (“O Berço do Herói” e “O Bem Amado” são
exemplos) ou Guarnieri, que assinalou o cotidiano da classe operária, alguns
temas eram especialmente caros a Williams, todos eles podendo se resumir na
obsessão de se estabelecer o império familiar, contudo prestes a desmoronar.
Tennessee escreveu
muitas obras geniais, claro, dentre as quais: a maravilhosa “Bonde Chamado
Desejo” (1947), “Anjo de Pedra” (1954), “Gata em Teto de Zinco Quente” (1955) e
“A Noite do Iguana” (1961). Há alguns anos, Décio contou que o espetáculo que
mais lhe marcara fora justamente o “Bonde”, que ele assistiu em Nova York. Em
cena, um ator bonito e muito jovem: Marlon Brando.
As personagens
femininas de Williams, porém, destacavam-se dos homens com quem contracenavam
porque elas eram passionais, fortes, exageradas, dominadoras. Suas peças
ganharam ressonância no cinema, seus enredos foram vistos em quase todos os
idiomas e sacudiram as grandes audiências. Elizabeth Taylor, morta em março,
simbolizou, sem dúvida, a maior expressão do que uma mulher saída da pena de
Tennessee seria capaz.
Yan Michalski, outro
gigante da crítica, apreciando a atmosfera de Williams, apontou uma “sociedade
condenada” e “sensibilidades adormecidas”. Elia Kazan, primeiro diretor do
“Bonde” falou em “civilização que agoniza”. Em síntese, floresce nesta
dramaturgia a convivência atribulada entre os indivíduos, gerando (como era de
se esperar) atritos descomunais, onde parece não haver nenhuma espécie de
escapatória para eles. Todavia, nota-se o desejo instintivo de não permanecerem
paralisados ante seus flagelos. Há, nas histórias de Williams, aquele começar e
recomeçar tal qual o bordado de Penélope.
É a capacidade de
enxergar a intimidade humana sem lentes embelezadoras, atrelada a um privilégio
de constatar que a prática é muito mais triste e distinta do que supõe a vã
filosofia teórica, que faz de certos homens grandes escritores. Tennessee fora
um deles.
A função do escritor,
por mais que arranhe determinadas sensibilidades é – parafraseando Todorov –
documentar a verdade.
Ao que nos consta, a
data passara despercebida por nossos elencos. E é lamentável que nenhum
encenador tenha manifestado o interesse de dirigir qualquer texto desta força
da natureza que foi Williams. Teatro, senhores diretores, é prestação de
serviço. Não se esqueçam jamais disso, como nós não nos esquecemos.
* É crítico de teatro e colaborador do blog NAVEGANTES....
Contato: junior_teo
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