Doloroso vexame

Foto: André Kertész | Série On Reading
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“Um homem tem mais o que fazer no mundo do que ler!” Ouço daqueles que desdenham da leitura. Falam-me assim esperando que eu reaja as suas provocações com ar solene de quem pensa em livros a toda hora, e não sabe fazer outra coisa na vida, a não ser gastar os olhos sobre o papel tingido a tinta preta. Admiro os livros. Sei lhes tirar as vantagens, que só eles, a sua maneira, podem me proporcionar. Não posso falar pelos outros admiradores de livros, que estão por aí, mas vou ao livro, porque sei nele apanhar grandes lições. Lições que se esfumam na vida real desbotada pelo condicionamento de um trabalho maçante que pouco ou nenhum espaço deixa para enxergar outras possibilidades de vida. A leitura de um bom livro permiti-nos dar à volta as ideias gastas pelo uso, e reformar, de inusitadas maneiras, as convicções inabaladas que, faziam de nós o eixo de rotação da terra. Todos que têm alguma coisa a mais à cabeça, além dos habituais enfeites que os médias lhes metem, também sabem das vantagens de dispensar algumas horas a admiração das histórias que os escritores criam. Aos outros não é suposto coisa alguma. Quando estão diante do desafio de estarem sozinhos consigo, tendo um livro à mão, acham-se inertes e sentem-se desocupados. E estar desocupado, num mundo que pede a todos que se ocupem, é um doloroso vexame, que a qualquer custo se deve evitar.


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