O enfado de pensar em demasia



Pensar em demasia é muito fatigante. Quando? Questiono-me ao ler um post no facebook de alguém que se diz cansado de pensar. Na busca de alento a sua consciência pesada, a tal pessoa, socorreu-se no que acreditava ser o último recurso disponível a um cérebro exaurido por mil inquietações: um livro cheio de sacanagem canhestra em linguagem rasteira, que vem fazendo as cabeças daqueles que desejam sossegar as suas cansadas mentes, com algo menos comprometedor aos seus doridos neurônios. Poucas vezes vi com tanta candura a utilização dessa literatura barata. É para isso mesmo que elas servem, asseguram-me seus leitores, para não ter que pensar. Deixar escapar o cérebro para rotas desconhecidas e percorrer caminhos ainda não desbravados é demais fatigante, ainda mais para quem estar tão desacostumado a essas rotinas de aventureiros. Esvaziar as suas consciências de qualquer tarefa mais pesada do que mergulhar num vazio de sentidos e nulidades, que não terão reverberações após o dobrar da última página, deve ter lá a sua eficiência, porque não canso de ver gente se socorrendo nesse refúgio. O enfado de uma existência vazia, só pode mesmo ser recompensado com uma alegoria de histórias vazias, onde a vida só tem sentido quando apanhada de quatro na cama tomando mil chibatadas antes de voltar ao vazio que a levou às peias.  Amortizar assim a tarefa de pensar, com ações de não ter que pensar, tem sido o exasperado recurso dos que imaginam pensar demais. As pessoas não sabem o que é pensar, porque nunca viveram a consciência de pensar. Estando apenas atulhadas de insignificâncias, imaginam com isso estar a pensar em demasia. Cercados por entulhos de informações inúteis que as impedem de avaliar o pensamento com critérios de qualidade que se distingue da quantidade. Iludem-se com a ideia de que andam pensando além do suportável. Estar com a cabeça cheia não é estar cansado de pensar é estar cansado de não pensar. Pensar para percebermos que não devemos pensar tanto. Pensar para refrear o pensamento. É não pensar. O verdadeiro pensamento não se cansa. A cada passo dado, a cada nova descoberta ele se constitui num renovado interesse sobre si mesmo e sobre o seu alcance.


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