Foto: Téo Júnior por ele mesmo.
Após 40 anos, “Playboy”
brasileira deixa de circular
Por. – TÉO JÚNIOR
Esses últimos anos não têm sido fáceis para o mercado
editorial brasileiro por n motivos. Destacaria
o pouco investimento em propaganda, a ausência de incentivo governamental de
mais impacto, a preguiça dos brasileiros para ler (me acuda, Sílvio Romero! Estamos
na média de 1,5 livro por ano para cada pessoa; um escárnio!), a desimportância
que os livros e jornais tem na vida da maioria das pessoas, incapazes que são
de dar 30 contos num Saramago porque “é muito caro” e a facilidade da internet
como meio que, gratuitamente, substitui o papel.
É bom frisar que nem todos os bons livros estão
disponíveis na rede. E os jornais só liberam parcialmente suas matérias, e não
todo o conteúdo, para não-assinantes.
Um amigo me falou, outro dia, que eu gosto das coisas
físicas. Tem toda razão. Não tenho paciência para ler nada em PDF (já me basta
meu trabalho cotidiano que consiste em eu ficar horas seguidas na frente de um
computador, baixando a barra e subindo; uma amiga, quando tomou meu notebook
emprestado, à minha revelia baixou “Cinquenta Tons de Cinza”, que adorou. Não
li porque estava ocupado com as memórias de Bruna Surfistinha, uma vagabunda, pois
sim) e evito ao máximo ouvir música em pen-drive, ver filmes em Youtube ou
baixados de internet (uma exceção foi “O Bebê de Rosimary”; cometi a loucura de
assisti-lo numa noite insone, 3 da madrugada). Como sou bastante fã de
Gutemberg, ainda prefiro ler no papel. Também gosto mais de ver filme em DVD e
depois guardar na estante. Nada substitui, para mim, folhear um livro, virar a
página, ler na cama ou manusear um disco e a ficha catalográfica. Abrir a caixa
do Submarino (com a faquinha de mesa) com livros da Black Friday, então? Um
orgasmo.
Recentemente, uma grande editora teve de fechar as portas
porque os lucros não estavam compensando o alto investimento nos livros, cujo
catálogo é composto por gente da envergadura de Paz e Tolstói. Um dos últimos
foi a extraordinária biografia de Michelangelo. O dono preferiu encerrar a empresa
a baixar o nível de suas publicações, como seria a reação natural em momento de
desespero econômico, com uma folha de pagamento para cobrir. Ao justificar o
fim da Cosac Naif, o proprietário disse que “não queria comprometer seu passado
e sua história”. Fez muito bem. Preferiu encerrar a empresa a cogitar a
possibilidade de jogar no mercado biografias que certamente poderiam alavancar as
vendas (quem sabe salvar a empresa?) de figuras como Claudia Leitte, Ivete Sangalo
ou Luan Santana – mas sem qualquer valor intelectual ou minimamente relevante.
A vida de Wesley Safadão ao lado de Bertolt Brecht? Numa edição de luxo? Capa
dura? Sem chance. Ou então recorrer àquelas publicações infantis, mas para
adultos, que consiste em fazer coisas estúpidas tipo “Destrua Este Diário”.
“Nesta página, coloque a cera de seu ouvido – ela é parte de você, sua
companheira”; na outra, “cole um pedaço de sua unha”; “esta página você rasgue,
para se desapegar das coisas”; “já esta você rasgue e amasse com toda força,
para descarregar o ódio que você sente de seu chefe” e por aí vai. Melhor
encerrar. Ninguém é obrigado.
A Planeta, nestes últimos anos, vem editando a
autobiografia de Edir Macedo; até o momento estamos no vol. 3. Como dizem os
crentes, uma bênção! Best-seller. Através de seu império chamado Igreja
Universal, Edir tem a oportunidade de divulgar sua obra nos quatro cantos do
mundo. Ensina como converter pessoas e como, barnabé do setor de loterias,
portanto assalariado, teve a bendita ideia de fundar uma igreja onde, antes,
funcionava uma funerária. Se “Nada a Perder” tivesse saído pela Cosac, a
editora talvez pudesse se manter mais um tempo.
No campo das revistas, a tristeza não é menor. Uma
ausência sentida foi a de “Bravo!”. Uma publicação linda, bem-feita, mas que se
tornou um calcanhar de aquiles para a editora. A Abril estava, com a melhor
publicação de cultura do Brasil, “vendendo o almoço para pagar a janta”, como
se diz. É público e notório que quando uma revista ou um caderno de jornal precisa
ser fechada (o), para conter gastos, é para a cultura que a tesoura se volta
primeiramente, e não para o ramo de veículos, casa & jardim ou
celebridades. O indivíduo pode perfeitamente ficar sem saber a última cotação
de um quadro de Van Gogh ou um texto inédito de Virginia Woolf, pode passar o
resto da vida sem conhecer a biografia de um pintor extraordinário chamado
Raimundo de Oliveira, mas é imprescindível que ele saiba que Claudia Raia está
de dieta ou Cauã Reymond arrumou uma namorada nova. Nada posso fazer, a não ser
lamentar tudo isso. Tomara que “Bravo!” volte um dia. Parou na edição 192.
“Bravo!” não circula mais. “Contigo”, porém, está aí,
firme e forte.
O FIM DE “PLAYBOY” –
Não sei se estou escorregando no óbvio ululante – alô, Nelson! –, mas “Playboy”,
cuja derradeira edição circulou até 10 de janeiro, não é – nem nunca foi –
apenas uma revista de mulher pelada. Trata-se de uma publicação de alto nível
cultural, séria, com entrevistas com gente que tem o que dizer e um elenco de
repórteres e cronistas de primeira linha, dentre os quais eu destacaria Ruy
Castro, Ivan Lessa e Mario Prata. Mesmo após a invasão dessas meninas nível
“BBB”, a “Playboy” não escorregou ao lugar-comum e sobreviveu durante 40 anos.
Lembro de um depoimento do jornalista Marcelo Rubens Paiva, que recordou seu
pai (deputado que “sumiu” na “ditabranda”) lendo “Playboy” no jantar da
família. Discorria, suponho, sobre conteúdo de caráter político. Por aí se tira
sua importância. Como Paiva morreu antes do início da publicação brasileira,
imagino que ele estivesse se referindo à “Playboy” americana.
Onde, por exemplo, eu li que o ex-sindicalista Lula disse
“admirar Hitler” (“não o homem, mas sua obstinação”)? Que Tarantino não faz a
menor questão de conhecer o pai? Que o manifesto contra a homofobia de Herchcovitch
é ser gay assumido, casado e na fila da adoção? Que Kajuru não passa um dia sem
um processo nas costas? Que Jece Valadão afirmou que frequentou a umbanda e
fingia receber o Exu tão-somente para transar com a mãe de santo? Que Sandy
disse que... (deixa essa pra lá!).
Mesmo aqueles que não são compradores contumazes de
“Playboy”, como eu, ficaram tristes porque uma revista de alto conceito não
mais existe. É uma a menos. Fará falta.
Uma revista que atingiu a vendagem de 1,3 milhão de
exemplares com Joana Prado na capa (dezembro de 99) amargava tiragem inferior a
50 mil
“Playboy” marcou minha adolescência, sim senhor! Puxo
pela memória que meus colegas, no 2° ou 3° ano, levavam para a escola revistas
de seus irmãos mais velhos, e até colegas mulheres, no intervalo, a folheavam
na maior naturalidade do planeta (admirando ou invejando um pouquinho?). Não
tinha professora dando piti nem o diretor da escola arrotando falso moralismo, Deus
nos livre!, indignado com aquele material impróprio para menores, passando de
mão em mão na sala. Nada disso. Tudo liberado, a bem da fantasia da garotada. A Pátria já era educadora nos tempos
de Fernando Henrique. País rico é país onde sua juventude se instrui
adequadamente. “Playboy” era nosso Carlos Zéfiro pós-Diretas Já. Colégio Tereza
Borges. Caetité, Bahia. Uma beleza! Tenho muita saudade.
Ah, como todo mundo tem a sua “Playboy” preferida, a
minha é a da “Anita” Mel Lisboa, de agosto de 2004. É isso aí.
Nenhum comentário:
Postar um comentário