As ilusões perdidas

Foto: Lewis Hine


Não sou mais dado a ilusões e fantasias. Talvez por isso esteja confortável com a ideia de que o homem é uma causa perdida. Não há nisso qualquer pessimismo, fatalismo ou entreguismo como daqueles que pressentindo essas coisas adoece da alma. Prefiro antes pensar que seja apenas uma constatação - uma obviedade incontornável- que como tal faz parte da ordem contraditória da vida que não nos cabe questionar. A putativa natureza humana é coisa que não se extingue sem extinguir o homem. Não serei eu, portanto o responsável por azeitar as engrenagens que faz correr macia e sem sobressaltos as correias da existência. Haverá sempre modos de infringir a ordem, e não será esse, modo irresponsável, o verdadeiro motor da vida? Chega de metafísica. Basta-me agora andar por cá; fazer alguns amigos, estender a vista ao mais largo que puder, viver algumas aventuras, ler uns bons livros, semear uma família e o mais, prolongar essas horas antes que o ponteiro pare de bater. Se calhar, ainda bem sou capaz de voltar a ter ilusões, afinal todo produto da natureza é imperfeito.

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