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Como professor, o meu
esforço tem sido mostrar aos meus alunos, que eles devem, em muitas circunstâncias,
pensar e agir como crianças. Não parece, mas essa não é uma tarefa fácil.
Não entendam crianças aí como um ser imaturo ou imberbe. Essa é uma versão
criada pelos adultos, que frustraram como crianças, e se envergonham disso.
Entendam crianças como, alguém que enxerga a vida como um livro aberto, cheio
de possibilidades.
A verdadeira criança é
traquina, buliçosa e aventureira. Ela não pára de perguntar e viajar nas
maravilhosas fantasias que encobrem o mundo racional. A criança é aquele ser
que dar beliscões no cérebro dos adultos, com perguntas embaraçosas como essa:
“se o homem espantalho e o homem de lata
não tem boca, como eles podem falar”. A criança é aquele serzinho que
assusta cotidianamente as palavras com frases desconcertantes: “o balão morreu por falta de ar” ou “as palavras que rimam são aquelas que não se
dão bem com as outras?”, “Podemos ser
astronautas e ilusionistas ao mesmo tempo?”. A infância, portanto, não é um
estágio passageiro da vida, e sim, aquele momento em que toda uma vida pode
caber num livro sobre, tigres, por exemplo.
Fico frustrado quando
meus alunos intentam me dissuadir da ideia de que os bichos não falam, ou de
que fantasmas e casas mal-assombradas são coisas falsas, irreais e ilusórias. Os
seres fantásticos existem na medida em que eles encenam ações prováveis e
possíveis. Devemos aprender as lições de Polônio em Hamlet que disse que com: “a
isca da falsidade apanha a carpa da verdade. Assim nós, os entendidos, usando
de cautela e circunlóquios, chegamos ao caminho por desvios”. E assim
age a fantasia. Por desvios na razão atingimos a verdade. Não é fantástico? Despidos
de verdades, falseando, trapaceando, podemos descortinar o mundo e encarar com
destemor os desafios da vida. Por isso não devemos duvidar da existência desses
seres maravilhosos. Eles existem, são tão reais quanto os ensinamentos que eles
ilustram. E tão vivos quanto os sentimentos que encarnam.
Há mais verdade nas estórias
fantásticas do que no mundo real. Não acredito, portanto, em alguém que não
crer na existência do Saci Pererê, Ogro, Pinóquio, Bruxas, Duendes e
principalmente me revolto contra aqueles que insistem em querer me convencer de
que o Pequeno Polegar não existe. Ora, isso já é demais. Para mim essas pessoas
é que vivem no mundo das ilusões e sofrem grave enfermidade. Eu tenho certeza
da existência desses seres. E principalmente creio que não existe apenas um
Pequeno Polegar, mas vários, todos eles espertos e ágeis como o que li no livro
de Perrault.
Não entendo como as
pessoas podem se tornar tão racionais a ponto de negarem o óbvio ululante. Eu
vejo alguns desses seres todos os dias. Convivo com eles. Conheço ao menos duas
bruxas, um dragão e quatro princesas encantadas, todas aguardando serenamente o
seu príncipe. Ainda não vi unicórnio, nem fadas, mas creio que isso não seja
motivo para desacreditar em sua existência, eles estão por aí, é certo. De
alguns desses seres sou muito amigo. Outros, assisto a distância, com medo do
que eles possam me fazer. Nem todos são bons. Há que se ter cuidado com os
seres fantásticos. Sou tímido, mas gostaria de navegar um dia com Simbad ou
Gulliver. Já li muitas vezes as suas histórias e fiquei enlevado. Ficaria encantado
em conhecer Lilipute de perto na nobre companhia de quem lá chegou primeiro e nos trouxe a notícia desse mundo tão surpreendente. Enquanto esse dia
não chega vou traçando planos para conhecer IL BARONE RAMPANTE que me observa
da estante, enquanto escrevo esse texto, doidinho para que eu o acompanhe em
mais uma grande aventura.
3 comentários:
Senti tanta delicadeza nas suas palavras que até viajei para reinos tão distantes, mas tangíveis(!). É por leituras como essa , que eu, " quando crescer vou ficar criança"( Manoel de Barros)
Rogerio, adorei seu texto eu comungo com você dessas ideias, e vivo num mundo fantastico ainda...Lindo texto..
Rogerio, adorei seu etxto...E comungo com você dessas ideias, lindo texto....
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