Elefante manso

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Não temos uma revista dedicada à literatura. As editoras que um dia se preocuparam com a qualidade literária pagaram o preço dessa ousadia e hoje se encontram de portas cerradas.  Nos jornais, os suplementos literários, que já foram palco para grandes discussões, deixaram de ser importantes e desapareceram das páginas dos diários. Com eles sumiram também a figura do crítico, do ensaísta, do polemista e do intelectual, naqueles termos que postulava Ortega y Gasset em: A Rebelião das Massas, o indivíduo que: aclarava um pouco as coisas, enquanto os outros, pelo contrário, costumavam consistir em confundi-la mais do que já estavam.

Todas essas notícias deveriam nos sugerir que não andamos a ler nada e não estamos nem um pouco interessados com o mundo à nossa volta. Mas estranhamente, ocorre precisamente o contrário. Diz-nos um jornal português que, nunca andamos tanto com um livro à mão como agora. Nunca estivemos tão à frente do mundo no quesito consumo de livros como nesse instante. Ninguém nos faz sombra, estamos na crista da onda. Podem se rir, achar que é tontaria, desequilíbrio, mas o fato é este mesmo, nunca tivemos tantos livros em nossas casas como hoje. O mundo nos inveja.

Mundo estranho. Justamente quando passamos a ser os maiores consumidores de livros do mundo amargamos estatísticas que não condizem com um público ilustrado pelas letras. Ou vão me dizer que acham normal não termos revistas, jornais e intelectuais pensando e dialogando com esse mar de gente que anda a ler incessantemente? Talvez o fato de estarmos todos enfronhados pela cultura do entretenimento e da massificação, que rebaixou tudo ao nível das mentalidades debiloides, expliquem melhor esse fenômeno quimérico que é o Brasil de hoje.


Não somos leitores com letra maiúscula. Não estamos ansiosos em ler para nos encorajar a desempenhar o papel clássico do elefante na loja de porcelana. Somos na verdade consumidores de bens culturais que são vendidos pelos discursos persuasivos e aliciantes da publicidade. Basta-nos que o livro nos consinta o status simbólico de posse de algum bem, e assim ele terá cumprido o seu valioso papel de fazer-nos sentir menos estúpidos, diante de um mundo que só reconhece o valor material e que foi convertido ao atrativo comercial sem nenhuma reserva moral. 

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