Uma boa foto não é uma que resulte
tecnicamente perfeita. Mas uma que sugira com um número pequeno de recursos,
uma mensagem que ultrapasse o que se ver de imediate. Fazer isso é muito difícil.
4
de
dezembro
Luz e cor
Não estou de acordo com os que afirmam
ser a fotografia colorida apenas destinada a tornar os elementos visuais
preponderantes. Menos ainda acredito que o p&b tenha o potencial de gerar
fotografias que apelam mais ao intelecto, enquanto que a foto colorida fala
somente aos sentidos. A polarização desses estilos, em critérios tão
definitivos, não me parece justa. Tanto o colorido pode ser destinado ao
intelecto, quanto o preto e branco pode dirigir-se aos sentidos. O uso de um ou
de outro estilo é apenas uma questão de empatia.
Entusiasmo
Ao ser destacado para realizar um livro
de contos populares, que reunisse a produção italiana desse gênero literário,
Ítalo Calvino vai dizer que, no meio do caminho foi tomado de tanto entusiasmo
pela tarefa que essa se tornou numa paixão que rapidamente se transformou em
mania. A febril compulsão pela recolha o fez dizer que, era bem capaz de trocar
o seu interesse por todo o Proust por uma nova variante do conto: O Burrinho
Caga Moedas de Ouro. “Havia sido capturado, de maneira imprevista, pela
natureza tentacular, aracnídea do meu objeto de estudo...”. Confessará o gênio
da literatura italiana. Sentirá o mesmo febril e compulsivo entusiasmo os
folcloristas que hoje se lançam a campo a busca de novas versões dos contos?
O Mergulhador - Vinícius de Moraes
.
O MERGULHADOR - VINÍCIUS DE MORAES.
Como, dentro do mar, libérrimos, os polvos
No líquido luar tateiam a coisa a vir
Assim, dentro do ar, meus lentos dedos loucos
Passeiam no teu corpo a te buscar-te a ti.
És a princípio doce plasma submarino
Flutuando ao sabor de súbitas correntes
Frias e quentes, substância estranha e íntima
De teor irreal e tato transparente.
Depois teu seio é a infância, duna mansa
Cheia de alísios, marco espectral do istmo
Onde, a nudez vestida só de lua branca
Eu ia mergulhar minha face já triste.
Nele soterro a mão como a cravei criança
Noutro seio de que me lembro, também pleno...
Mas não sei... o ímpeto deste é doído e espanta
O outro me dava vida, este me mete medo.
Toco uma a uma as doces glândulas em feixes
Com a sensação que tinha ao mergulhar os dedos
Na massa cintilante e convulsa de peixes
Retiradas ao mar nas grandes redes pensas.
E ponho-me a cismar… - mulher, como te expandes!
Que imensa és tu! maior que o mar, maior que a
infância!
De coordenadas tais e horizontes tão grandes
Que assim imersa em amor és uma Atlântida!
Vem-me a vontade de matar em ti toda a poesia
Tenho-te em garra; olhas-me apenas; e ouço
No tato acelerar-se-me o sangue, na arritmia
Que faz meu corpo vil querer teu corpo moço.
E te amo, e te amo, e te amo, e te amo
Como o bicho feroz ama, a morder, a fêmea
Como o mar ao penhasco onde se atira insano
E onde a bramir se aplaca e a que retorna sempre.
Tenho-te e dou-me a ti válido e indissolúvel
Buscando a cada vez, entre tudo o que enerva
O imo do teu ser, o vórtice absoluto
Onde possa colher a grande flor da treva.
Amo-te os longos pés, ainda infantis e lentos
Na tua criação; amo-te as hastes tenras
Que sobem em suaves espirais adolescentes
E infinitas, de toque exato e frêmito.
Amo-te os braços juvenis que abraçam
Confiantes meu criminoso desvario
E as desveladas mãos, as mãos multiplicantes
Que em cardume acompanham o meu nadar sombrio.
Amo-te o colo pleno, onda de pluma e âmbar
Onda lenta e sozinha onde se exaure o mar
E onde é bom mergulhar até romper-me o sangue
E me afogar de amor e chorar e chorar.
Amo-te os grandes olhos sobre-humanos
Nos quais, mergulhador, sondo a escura voragem
Na ânsia de descobrir, nos mais fundos arcanos
Sob o oceano, oceanos; e além, a minha imagem.
Por isso - isso e ainda mais que a poesia não ousa
Quando depois de muito mar, de muito amor
Emergido de ti, ah, que silêncio pousa
Ah, que tristeza cai sobre o mergulhador!Ah, que
tristeza cai sobre o mergulhador!
Se de Rudyard Kipling
Se
Se és capaz de manter a tua calma quando
Todo o mundo ao teu redor já a perdeu e
te culpa;
De crer em ti quando estão todos
duvidando,
E para esses no entanto achar uma
desculpa;
Se és capaz de esperar sem te
desesperares,
Ou, enganado, não mentir ao mentiroso,
Ou, sendo odiado, sempre ao ódio te
esquivares,
E não parecer bom demais, nem
pretensioso;
Se és capaz de pensar --sem que a isso
só te atires,
De sonhar --sem fazer dos sonhos teus
senhores.
Se encontrando a desgraça e o triunfo
conseguires
Tratar da mesma forma a esses dois
impostores;
Se és capaz de sofrer a dor de ver
mudadas
Em armadilhas as verdades que disseste,
E as coisas, por que deste a vida,
estraçalhadas,
E refazê-las com o bem pouco que te
reste;
Se és capaz de arriscar numa única
parada
Tudo quanto ganhaste em toda a tua vida,
E perder e, ao perder, sem nunca dizer
nada,
Resignado, tornar ao ponto de partida;
De forçar coração, nervos, músculos,
tudo
A dar seja o que for que neles ainda
existe,
E a persistir assim quando, exaustos,
contudo
Resta a vontade em ti que ainda ordena:
"Persiste!";
Se és capaz de, entre a plebe, não te
corromperes
E, entre reis, não perder a
naturalidade,
E de amigos, quer bons, quer maus, te
defenderes,
Se a todos podes ser de alguma
utilidade,
E se és capaz de dar, segundo por
segundo,
Ao minuto fatal todo o valor e brilho,
Tua é a terra com tudo o que existe no
mundo
E o que mais --tu serás um homem, ó meu
filho!
"If", de Rudyard Kipling;
tradução de Guilherme de Almeida. Em tempos nebulosos, onde palácios de
governos se confundem com lupanários, e onde políticos estão absolutamente
disponíveis para negociatas as abertas, If, de Rudyard Kipling restitui-nos a
grandeza humana apostando naquilo que ela tem de mais honrosa: A persistência
em novas atitudes , mesmo ante tão maus exemplos.
1
de
dezembro
Economês
Ontem os jornais anunciaram que a taxa
de juros selic caiu 0,25 pontos percentuais. No mesmo dia, os membros do maior
cartel do mundo (que também atende pelo nome de OPEP) foi à imprensa anunciar a
redução da produção de petróleo, com o intuito de ajudar as economias
dependentes da exportação desse produto, aumentarem as suas receitas. Não
entendo economês, mas jurava que todos esses anúncios na imprensa, pelo ar de
contentamento dos apresentadores, sugeriam que a engrenagem da economia estava
sendo, finalmente, azeitada com óleo e não com arreia. Desejoso de comprar um
livro saltei do sofá e corri à internet. Se a economia vai bem os livros devem
estar uma baba. Ledo engano. O entusiasmo dos economistas não se refletiu no
ânimo das lojas virtuais. Imagina que um livro que namoro há dias saia da loja
na semana passada por 9,90 mangos. Ontem o mesmo livro estava por 35,94
mirréis. Hoje o livro só sai da loja pela assustadora quantia de 44,93
dinheiros. Não adianta a taxa de juros caírem, os carteis acenarem com boas
notícias, ninguém está acreditando mais nos gurus de Wall Street. O resultado
disso tudo é que a estante lá de casa vive reclamando orfandade dos livros.
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