POESIA E SUBVERSÃO

Toda poesia é uma subversão dos signos. O poeta não se contém diante da possibilidade mágica das palavras que nomeia uma coisa, mas com ela pode estar insinuando outras. Por signo entendemos a palavra ou imagem que implica alguma coisa além do seu significado manifesto e imediato. O poeta diz uma palavra (jogo), ou constrói uma imagem, através de uma série de palavras. Nessa imagem podemos ver um cenário e seus personagens, como no poema Idade, de Mário Quintana, por exemplo:

IDADE

Estou nessa idade me que o juiz consulta o relógio e as arquibancadas já vão se esvaziando...

Seu significado imediato, sua aparência objetiva, sua significação cotidiana, fala de uma realidade facilmente apreensível - uma partida de futebol que se aproxima do fim. Desse modo, o poema, não se constitui em nenhum desafio a sua compreensão. Muito menos parece esta subvertendo coisa alguma. Porém, as leituras desses versos sugerem, para aquele dotado de sensibilidade, como algo a mais do que aquilo que ele anuncia.

Este é um modo de ler proposto pela poesia. Negando a realidade dada, construímos outras, associado com os símbolos fundados pelo poeta. Assim, esses simples versos, que nos fala da aproximação do fim de um jogo, pode se revestir numa reflexão sobre a vida e sua brevidade, ou ainda, sobre a transitoriedade, a passagem, a forma com que tudo um dia chega fatidicamente ao fim.

Esse é o artifício construído pelo poeta para alcançar zonar do inconsciente do leitor. Através da subversão dos signos dados, (idade, juiz, relógio, arquibancadas, esvaziando), o poema, transcende essa realidade, para vislumbrar outra, ocultada pela mesmice com que sempre fixamos essas palavras. Ao encararmos essas palavras como signos, elas se elevam a outros sentidos, que vão além daqueles comumente empregados. Dizem mais do que aquilo a aqui estávamos acostumados a ouvir delas, restauram assim sua vitalidade.

Uma leitura dicionaresca daria conta do sentido da mensagem. Mas poesia é algo mais. 

A poesia se utiliza dos artifícios das palavras para, desequilibrando nossos sentidos, revelar-nos outros possíveis, que por conta do uso indiscriminado acabaram embotadas, adormecidas, hibernando em alguma parte de nos mesmo esperando apenas o estímulo necessário para despertar.

Ler um poema, apreciar uma obra de arte, assistir um bom filme, é o mesmo que celebrar a descoberta de algo novo. As surpresas que se ocultam por trás de uma obra podem reverter-se naquela compensação desejada pelo leitor.

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