Uma boa foto não é uma que resulte
tecnicamente perfeita. Mas uma que sugira com um número pequeno de recursos,
uma mensagem que ultrapasse o que se ver de imediate. Fazer isso é muito difícil.
4
de
dezembro
Luz e cor
Não estou de acordo com os que afirmam
ser a fotografia colorida apenas destinada a tornar os elementos visuais
preponderantes. Menos ainda acredito que o p&b tenha o potencial de gerar
fotografias que apelam mais ao intelecto, enquanto que a foto colorida fala
somente aos sentidos. A polarização desses estilos, em critérios tão
definitivos, não me parece justa. Tanto o colorido pode ser destinado ao
intelecto, quanto o preto e branco pode dirigir-se aos sentidos. O uso de um ou
de outro estilo é apenas uma questão de empatia.
Entusiasmo
Ao ser destacado para realizar um livro
de contos populares, que reunisse a produção italiana desse gênero literário,
Ítalo Calvino vai dizer que, no meio do caminho foi tomado de tanto entusiasmo
pela tarefa que essa se tornou numa paixão que rapidamente se transformou em
mania. A febril compulsão pela recolha o fez dizer que, era bem capaz de trocar
o seu interesse por todo o Proust por uma nova variante do conto: O Burrinho
Caga Moedas de Ouro. “Havia sido capturado, de maneira imprevista, pela
natureza tentacular, aracnídea do meu objeto de estudo...”. Confessará o gênio
da literatura italiana. Sentirá o mesmo febril e compulsivo entusiasmo os
folcloristas que hoje se lançam a campo a busca de novas versões dos contos?
O Mergulhador - Vinícius de Moraes
.
O MERGULHADOR - VINÍCIUS DE MORAES.
Como, dentro do mar, libérrimos, os polvos
No líquido luar tateiam a coisa a vir
Assim, dentro do ar, meus lentos dedos loucos
Passeiam no teu corpo a te buscar-te a ti.
És a princípio doce plasma submarino
Flutuando ao sabor de súbitas correntes
Frias e quentes, substância estranha e íntima
De teor irreal e tato transparente.
Depois teu seio é a infância, duna mansa
Cheia de alísios, marco espectral do istmo
Onde, a nudez vestida só de lua branca
Eu ia mergulhar minha face já triste.
Nele soterro a mão como a cravei criança
Noutro seio de que me lembro, também pleno...
Mas não sei... o ímpeto deste é doído e espanta
O outro me dava vida, este me mete medo.
Toco uma a uma as doces glândulas em feixes
Com a sensação que tinha ao mergulhar os dedos
Na massa cintilante e convulsa de peixes
Retiradas ao mar nas grandes redes pensas.
E ponho-me a cismar… - mulher, como te expandes!
Que imensa és tu! maior que o mar, maior que a
infância!
De coordenadas tais e horizontes tão grandes
Que assim imersa em amor és uma Atlântida!
Vem-me a vontade de matar em ti toda a poesia
Tenho-te em garra; olhas-me apenas; e ouço
No tato acelerar-se-me o sangue, na arritmia
Que faz meu corpo vil querer teu corpo moço.
E te amo, e te amo, e te amo, e te amo
Como o bicho feroz ama, a morder, a fêmea
Como o mar ao penhasco onde se atira insano
E onde a bramir se aplaca e a que retorna sempre.
Tenho-te e dou-me a ti válido e indissolúvel
Buscando a cada vez, entre tudo o que enerva
O imo do teu ser, o vórtice absoluto
Onde possa colher a grande flor da treva.
Amo-te os longos pés, ainda infantis e lentos
Na tua criação; amo-te as hastes tenras
Que sobem em suaves espirais adolescentes
E infinitas, de toque exato e frêmito.
Amo-te os braços juvenis que abraçam
Confiantes meu criminoso desvario
E as desveladas mãos, as mãos multiplicantes
Que em cardume acompanham o meu nadar sombrio.
Amo-te o colo pleno, onda de pluma e âmbar
Onda lenta e sozinha onde se exaure o mar
E onde é bom mergulhar até romper-me o sangue
E me afogar de amor e chorar e chorar.
Amo-te os grandes olhos sobre-humanos
Nos quais, mergulhador, sondo a escura voragem
Na ânsia de descobrir, nos mais fundos arcanos
Sob o oceano, oceanos; e além, a minha imagem.
Por isso - isso e ainda mais que a poesia não ousa
Quando depois de muito mar, de muito amor
Emergido de ti, ah, que silêncio pousa
Ah, que tristeza cai sobre o mergulhador!Ah, que
tristeza cai sobre o mergulhador!
Se de Rudyard Kipling
Se
Se és capaz de manter a tua calma quando
Todo o mundo ao teu redor já a perdeu e
te culpa;
De crer em ti quando estão todos
duvidando,
E para esses no entanto achar uma
desculpa;
Se és capaz de esperar sem te
desesperares,
Ou, enganado, não mentir ao mentiroso,
Ou, sendo odiado, sempre ao ódio te
esquivares,
E não parecer bom demais, nem
pretensioso;
Se és capaz de pensar --sem que a isso
só te atires,
De sonhar --sem fazer dos sonhos teus
senhores.
Se encontrando a desgraça e o triunfo
conseguires
Tratar da mesma forma a esses dois
impostores;
Se és capaz de sofrer a dor de ver
mudadas
Em armadilhas as verdades que disseste,
E as coisas, por que deste a vida,
estraçalhadas,
E refazê-las com o bem pouco que te
reste;
Se és capaz de arriscar numa única
parada
Tudo quanto ganhaste em toda a tua vida,
E perder e, ao perder, sem nunca dizer
nada,
Resignado, tornar ao ponto de partida;
De forçar coração, nervos, músculos,
tudo
A dar seja o que for que neles ainda
existe,
E a persistir assim quando, exaustos,
contudo
Resta a vontade em ti que ainda ordena:
"Persiste!";
Se és capaz de, entre a plebe, não te
corromperes
E, entre reis, não perder a
naturalidade,
E de amigos, quer bons, quer maus, te
defenderes,
Se a todos podes ser de alguma
utilidade,
E se és capaz de dar, segundo por
segundo,
Ao minuto fatal todo o valor e brilho,
Tua é a terra com tudo o que existe no
mundo
E o que mais --tu serás um homem, ó meu
filho!
"If", de Rudyard Kipling;
tradução de Guilherme de Almeida. Em tempos nebulosos, onde palácios de
governos se confundem com lupanários, e onde políticos estão absolutamente
disponíveis para negociatas as abertas, If, de Rudyard Kipling restitui-nos a
grandeza humana apostando naquilo que ela tem de mais honrosa: A persistência
em novas atitudes , mesmo ante tão maus exemplos.
1
de
dezembro
Economês
Ontem os jornais anunciaram que a taxa
de juros selic caiu 0,25 pontos percentuais. No mesmo dia, os membros do maior
cartel do mundo (que também atende pelo nome de OPEP) foi à imprensa anunciar a
redução da produção de petróleo, com o intuito de ajudar as economias
dependentes da exportação desse produto, aumentarem as suas receitas. Não
entendo economês, mas jurava que todos esses anúncios na imprensa, pelo ar de
contentamento dos apresentadores, sugeriam que a engrenagem da economia estava
sendo, finalmente, azeitada com óleo e não com arreia. Desejoso de comprar um
livro saltei do sofá e corri à internet. Se a economia vai bem os livros devem
estar uma baba. Ledo engano. O entusiasmo dos economistas não se refletiu no
ânimo das lojas virtuais. Imagina que um livro que namoro há dias saia da loja
na semana passada por 9,90 mangos. Ontem o mesmo livro estava por 35,94
mirréis. Hoje o livro só sai da loja pela assustadora quantia de 44,93
dinheiros. Não adianta a taxa de juros caírem, os carteis acenarem com boas
notícias, ninguém está acreditando mais nos gurus de Wall Street. O resultado
disso tudo é que a estante lá de casa vive reclamando orfandade dos livros.
30
de
novembro
O Brasil que envegonha
OS DEPUTADOS NESSA MADRUGADA
DESCONFIGURARAM E SEPULTARAM DE VEZ AS MEDIDAS PROPOSTAS PELA POPULAÇÃO DE
MORALIZAÇÃO DA POLÍTICA. VEJAM O QUE FOI REJEITADO:
1. A tipificação de crime de
enriquecimento ilícito de funcionários públicos;
2. A ideia de tornar a prescrição de
crimes mais difícil;
3. A facilidade de retirar os bens
adquiridos com atividade criminosa;
4. A instituição do chamado “delator do
bem” (pessoa que garantia uma recompensa por entregar autoridade envolvidas em
crimes);
5. Outras medidas suprimidas foram as
sugeridas pelo MP de endurecimento da Lei de Improbidade e da possibilidade de
cassação do registro e de punições mais severas a partidos e dirigentes que
cometeram crimes graves;
O QUE FICOU:
1. A criminalização específica do crime
de caixa dois
2. Inclusão de alguns crimes na
categoria de hediondos, caso o valor desviado supere R$ 8,8 milhões
29
de
novembro
O povo cubano
Fotos: Peter Turnley - Cuba.
A morte de Fidel, ocorrida na última
semana, mobilizou, como era esperado, um mundo de emoções. Os meus amigos do
Face refletiram bem os humores que veem à tona, quando em causa estar o lugar
de Fidel e da revolução na história.
Uns deram graças pela morte do
comandante. Outros lamentaram.
Do que pude perceber dos discursos foi
que: A estima ou o repúdio expressado pelo comandante eram todos motivados por
posicionamentos caolhos do pensamento ideológico. É triste que assim seja.
As ideologias, apesar dos floreados, do
rococó discursivo ou de possíveis subtilezas maneiristas, não passa de ser o
que é: um ladrar sobre coisas que estão de acordo com aquilo que a sua cartilha
ideológica permite dizer.
Não quero polemizar com os amigos se
Fidel tinha ou não razão em dar lugar ao pensamento único e ao arredamento dos
ideais democráticos. Por isso guardo comigo o que penso dele.
Foco atenção hoje no povo que é o que de
melhor existe em Cuba. E penso que sobre este deve haver alguma unanimidade que
permita que um post não se torne um campo de batalha apaixonado, cujo resultado
não é outro senão, o aumento de tensões desnecessárias entre pessoas que se
tivessem em outra situação teriam, com certeza, bons motivos para se tornarem
fraternos amigos.
E quem melhor pode revelar um povo senão
a fotografia.
Recentemente, descobri uma série de
fotos feitas por um fotógrafo americano que nos faz pensar a ilha pela
perspectiva de sua gente.
Os registros são simplesmente
deslumbrantes. Nele quem esperava ver um povo moribundo e enfunado em suas
queixas, espantasse com o registro de Cuba irradiante de cores, luz, alegria e
altivez.
Estas fotos faz pensar que, talvez os
ocidentais avaliem a liberdade pelo conceito que têm dela mesma, e não sobre a
ótica de outra realidade histórica.
P.S. Todas essas fotos foram obtidas na
Internet. Todas as que forem objeto de direitos de autor, e a tal publicação o
seu titular se oponha, serão removidas imediatamente por mim assim que receber
qualquer notificação.
28
de
novembro
Seu Helvércio
Remanescente da comunidade de Rio das
Rãs que vive hoje em Serra do Ramalho. O Senhor Helvércio nasceu e se criou
numa fazendo na região do Rio das Rãs. Tanto ele como os familiares serviram a
vida inteira ao Coronel Deocleciano Teixeira que em inicio do século XX
estabeleceu o controle sobre as terras da região do Rio das Rãs e manteve sobre
o seu domínio remanescentes quilombolas como agregados. Os conflitos que se
iniciaram na década de 70 entre posseiros, grileiros e remanescentes,
precipitou a saída de Seu Helvércio do Rio das Rãs, onde era vaqueiro, para
Serra do Ramalho região que na ocasião, passava por uma ampla reforma de
distribuição de terras. Hoje seu Helvércio é pescador. No dia em que o
encontrei (27 de novembro de 2016) ele tecia a rede que em breve voltaria a
lançar no Rio São Francisco, depois de ter cumprido o período de defeso. O Seu
Helvércio é um sobrevivente. Primeiro dos desmandos dos coronéis da região,
depois das disputas de terra e por fim das precárias condições de vida impostas
pela desigualdade social que impera no nosso país.
26
de
novembro
FIDEL CASTRO.
Em fins dos anos 50, Fidel Castro e seus
companheiros pôs o mundo a sonhar. A sonhar com uma sociedade livre e
igualitária. Em parte ele concretizou o seu grande plano.
Por décadas Cuba se orgulhou de não ter
uma única criança mendigando na rua ou viu as suas mulheres terem que se prostituirem,
como faziam no antigo regime, para sobreviverem.
Ainda hoje Cuba é uma referência para o
mundo, quando em causa está o respeito a alguns direitos da sociedade. Cuba foi
o primeiro país das Américas a erradicar o analfabetismo. Nem mesmo o EUA chegou
perto disso. Recentemente a ONG Save the Childre divulgou dados que mostram que
Cuba é o melhor país da América Latina para se nascer uma menina.
Os cubanos sobre o regime de Castro
viveram tempos de prosperidade. Porém, no meio do caminho, o sonho se tornou um
pesadelo.
Para algumas centenas de milhares de
pessoas, o regime representou o que de pior poderia haver em matéria de
política.
Estima-se que El Comandante mandou ao
"el paredón", cerca de 17 mil desafetos. Alguns atribuem estes
revezes, as tentativas de Washington de frearem o empenho de Castro em levar
adiante as reformas sociais que possibilitariam melhores condições de vida ao seu
povo.
Não podemos perder de vista que, após as
relações com Cuba azedarem, dois anos depois da Revolução, o governo Americano
se empenhou em deter a escalada cubana rumo à autossuficiência econômica e
política.
Sobre a influência de Washington,
dissidentes do Regime Cubano armaram, por muito tempo, atentados contra Cuba.
Criaram rádios em Miami para influenciarem a população cubana e chegaram ao
cumulo de fazerem sobrevoos nas plantações de tabaco nas fazendas campesinas,
para inviabilizarem a economia do tabaco na ilha.
A Revolução venceu todos as tentativas
de sabotagem. Até que Washington deu a última cartada. Impôs sobre a ilha um
embargo econômico que impede que países comercializem com o regime. As
consequências dessa medida Cuba e seu povo sentem até hoje.
Agora que a notícia da morte de Castro
chega aos jornais do mundo, a pergunta que todos se fazem é: O que será de Cuba
sem a presença de seu grande símbolo?
23
de
novembro
Vida Interior
O ator britânico, Richard Burton, famoso
por interpretar do cinema personagens fortes e fora das telonas, pelo
comportamento autodestrutivo e pelo conturbado relacionamento com Liz Taylor,
escreveu durante muitos anos um diário.
Nos escritos saltam aos olhos os relatos
do gosto pessoal do ator pela literatura.
São raros os dias em que ele não anota
estar lendo um livro, visitando livrarias ou planejando a compra de exemplares
para as próximas férias.
Numa das entradas do diário há uma
curiosidade. Burton sempre que visita os amigos procura saber onde fica a biblioteca
na casa do anfitrião.
Ao ser convidado por Frank Sinatra, para
um fim de semana em sua mansão em Nova Iorque, Burton ficou chocado com a
quantidade e a qualidade dos livros na sala de estar do velho filho de
imigrantes pobre da Itália.
Mais tarde conversando com um amigo
Burton veio a saber que Sinatra nunca visitou a biblioteca de sua residência.
Todos aqueles livros eram peças de
decoração. Os velhos olhos azuis gostava de outro tipo de passatempo.
21
de
novembro
Um primor de foto
Foto: Claudio Rasana: Katlehong Matsenen 2016 from the series Similar Uniforms.
O prêmio Taylor Wessing, atribuído pela
National Portrait Gallery de Londes foi este ano para o suíço Claudio Rasana. A
fotografia laureada é um primor de registro. Alguns poderão dizer, mais o que
esta foto tem de tão especial que mereça ser destacada com um prêmio? Essa
pergunta acontece sempre. Eu mesmo já ouvi inúmeras vezes muita gente
inteligente perguntar o que pode ter de especial uma foto. Isso ocorre, penso
eu, porque estamos mal acostumados a imaginar na foto no que ela tem apenas de
aparente, e não naquilo que ela tem se sugestivo.
Num contexto de uma sociedade que tudo
quer enquadrar, alinhar e uniformizar, a foto de Rasana sugere, através do
olhar de atitude inquieta do rapaz e da gravada desmazelada, um desalinho com
as normas que impõem homogeneização às individualidades. Está aí o quê de
especial na foto. Ela demonstra o inconformismo e o desalinho com as convenções
que tenta nos impor vontades. O indivíduo revela-nos a foto de Rasana,
prevalecerá sempre, a despeito das tentativas de uniformização.
27
de
outubro
O indiferença dos vereadores de Caetité ou como os homens exercem seus podres poderes
.
Olhando
displicentemente pela janela do meu apartamento vejo, uma paisagem que era rara
há alguns anos. Espalham-se pelo horizonte placas de ALUGA-SE nas casas,
prédios e imóveis, até aonde minha vista pode alcançar. Não sou nenhum
economista. Tenho certa dificuldade em operar os números. Mas imagino que esse
cenário sugere uma desidratação na economia local. A debandada das empresas com
contingentes enormes de homens também deve ter afetado os cofres públicos. As
razões são óbvias. Por sua vez esses reveses também devem ter atingido de forma
negativo o comercio – grande fonte de recursos tributários para o município. Como
são praxe nessas ocasiões, os patrões, pensando na saúde financeira de seus
empreendimentos, devem ter cortado a um número mínimo os seus funcionais. O
impacto dessa desaceleração deve ter atingido todo mundo. Porém, aos vereadores
de Caetité não é suposto que estejamos vivendo um momento que pede dos
políticos serenidade e respeito, além de ações eficientes no estancamento dessa
sangria econômica. Com menos de um mês após as eleições, com uma desfaçatez
nunca antes vista, eles têm a cara de pau, em meio a esse cenário de terra
arrasada, votarem um aumento salarial vultoso que contempla única e
exclusivamente os seus próprios interesses. Alguém aí avise aos digníssimos senhores
do legislativo que há uma crise em curso no país e que ela está vitimando gente.
Ou eles pensam que ainda estamos no período das vacas gordas? Saiam de seus gabinetes
excelências.
25
de
outubro
A farra com o dinheiro público
.
Imaginem
que em meio a uma crise sem precedentes no país, os vereadores de Caetité
votaram, em sessão pra lá de controversa, um aumento vultoso em seus já
nababescos salários. Fazem isso, enquanto estoura demissões de trabalhadores no
município feito pipoca na panela quente. E em vez de ajudarem o povo a
superarem essas dificuldades, os digníssimos vereadores preferem agirem em
causa própria. Dão assim um vergonhoso exemplo de como são insensíveis aos
dramas de pais e mães, que têm que conviverem diariamente com o terror do
desemprego. Viram as costas àqueles que deveriam defender e mostram-se sem
vexame diante da situação financeira do município. Sinceramente senhores, vocês
não são dignos do posto que ocupam.
16
de
outubro
Uma nova descoberta.
Depois que ingressei no Instagram
descobri um mundo novo para fotografia. Nele encontro todos os dias o trabalho
de grandes mestres. O mais recente achado foi o trabalho do Americano Alex
Webb. São surpreendentemente simples e belas as suas imagens. Elas me fizeram
pensar as minhas próprias imagens, com tudo o que tenho ainda para aprender.
Por exemplo, percebi com ele que, devemos dar a máxima atenção às sombras na
composição de uma foto, quando se quer extrair dela mais do que um simples
registro banal. E mais, é possível contar diversas histórias em uma única
imagem, tomando o devido cuidado e mantendo a sensibilidade, para não poluir
demais a foto com motivos que não estejam em equilíbrio.
Antônio Carlos Viana
.
Téo Júnior me acordou hoje com a triste
notícia, de que aquele que tantas vezes nos foi o motivo de encontros felizes,
nos deixou hoje. Partiu o escritor sergipano Antônio Carlos Viana. Embora ele
não tenha sido um escritor de grandes multidões, assim mesmo deixou-nos um
conjunto de contos que, se mostram indispensáveis a quem queira apanhar, mais
do que sorrisos bobos com a literatura. Além de seu legado literário, ele
também nos deixou o bonito exemplo de uma vida dedicada à docência. Ainda
enquanto buscava um lugar ao sol na literatura, Viana passou a vender, na
frente de uma escola, cachorro-quente, para conseguir o dinheiro e o tempo que
o permitisse fazer o sonhado curso de letras. Nos intervalos de atendimento, entre
um cliente e outro, ele lia, incansavelmente, todos os grandes mestres da
literatura e assim se preparava para o cumprimento de seu tão desejado sonho.
Hoje que se comemora o dia do professor e os professores reclamam direitos e o
governo manda sobre eles os cães como se de vulgares bandidos se tratasse, quis
o destino que o melhor de nossos exemplos de resistência e luta deixasse-nos.
Chora assim duplamente a literatura que perde um de seus melhores mestres e a
docência que deixa de contar com a mais digna das vozes de oposição ao descaso.
Descanse em paz Antônio.
8
de
outubro
Sobre a proibição da vaquejada pelo STF
É interessante a leitura da discussão.
Nela percebemos que ainda albergamos em nós o pensamento evolucionista, que se
pauta na ideia de que antes vivíamos num estágio inferior e agora, com as novas
práticas subimos um degrau na evolução. Penso que isso é muito pretensioso. Mas
é comum. Ensina-nos a história, que as comunidades de um determinado tempo se
acham acima das demais e se sentem superiores as que a antecederam.
Se as práticas culturais existem, isso
se deve ao fato de que elas servem para cumprir, em determinadas comunidades,
papeis simbólicos que permitem a sobrevivência dos grupos sociais a ela
vinculadas. Não se trata de primitivismo.
Além disso, falamos com desprendimento
dos costumes alheios como se parte dele fizesse, e por isso podemos condena-los
e inferiorizá-los. Agiram de modo semelhante os primeiros antropólogos que
visitaram uma comunidade no pacífico que mantinha, aos olhos dos expedicionários,
uma prática primitiva de confecção de totens.
Cada agrupamento da ilha mantinha um
totem como símbolo de seu grupo. Um era peixe, outro era ave... O tabu imposto
pela tradição impedia que homens de um determinado grupo tivessem relação com
as mulheres que cultuavam o mesmo totem. Logo, os doutos cientistas sociais,
querendo integrar aqueles homens “primitivos”, num novo mundo, onde as
superstições haviam sido abolidas, se encarregaram de destruírem os totens.
Marcel Mauss vai dizer mais tarde que
aquela intervenção precipitou o fim da comunidade. Os totens de vários grupos
tinham funções de evitar os laços consanguíneos, que numa comunidade pequena
era a salvaguarda contras as doenças, porque agia para fortalecia a variação
genética que permitia a perpetuação dos vários grupos.
“Não há”, dizia Claude Levi-Strauss
“costumes que sobrevivam sem motivos”. As práticas de uma determinada
sociedade, por mais brutais que pareçam, servem a propósitos comunitários e
sociais, que nem sempre percebemos a razão. Essas práticas estão quase sempre
associadas à ideia de iniciação. Creio que não compete a nós dizer aos outros os
que são melhores.
“Nas sociedades primitivas”, escreveu
Joseph Campbell “dentes são arrancados, dolorosas escarificações são feitas, há
circuncisões, toda sorte de coisas acontecem, para que você abdique para sempre
do seu corpinho infantil e passe a ser algo inteiramente diferente. Quando eu
era criança, nós vestíamos calças curtas... calças pelos joelhos. E chegava
então o grande momento em que você vestia calças compridas.”
As mutilações fazem parte de ritos de
iniciação que integram as crianças ao mundo dos adultos. As mutilações têm
portanto uma função, não são meros atos bárbaros. Em nossa sociedade os ritos
de passagem foram abolidos ou edulcorados, não ajudam mais as pessoas a se
“relacionar com o mundo, ou a compreendê-lo, para além do meramente visível.”.
O resultado é que as crianças, escreveu Campbell, não sabem que já são homens e
precisam abandonar as criancices. Crescem como os jogadores de futebol,
infantilizados e imaturos. Ou como as madames, presas da propaganda cosmética,
que iludem as velhinhas com a promessa da eterna juventude.
No extraordinário ensaio sobre a arte da
tauromaquia, o antropólogo francês Michel Leiris, diz que o espetáculo brutal
da luta do homem contra o touro na arena ocupa aquele lugar de revelação de
experiências cruciais que esclarecem partes obscuras de nós mesmos. A luta e a matança do touro opera desse modo
uma purgação que aplaca os picos de febre sem que o homem tenha que recorrer,
para se exteriorizar, seja a uma via explosiva, seja a um disfarce utilitário
ou racional das vias reais.
“Mas em nossos dias”, escreveu o
antropólogo, “não é mais possível encontrar escape confessável para tais
impulsos... Daí o tédio, a impressão de vida castrada, a tal ponto que, aos
olhos de alguns, as conjunturas mais catastróficas podem parecer desejáveis,
uma vez que ao menos teriam o poder de colocar em jogo a totalidade de nossa
existência.”.
Trouxe esses exemplos de
"brutalidade" cultural para mostrar que eles existem por que cumprem
funções nas sociedades que as criaram. Aboli-las, pareceriam a nos que não
fazemos parte dessa realidade, a coisa mais sensata a se fazer. Porém, isso
implicaria um dano a elas que ameaçaria a sua sobrevivência. Como aconteceu com
as comunidades do pacifico que foram vítimas das melhores intenções ocidentais.
Temos que ter cautela ao nos
pronunciamos sobre realidades que nos são “estranhas”. No campo cultural o que
nos parece insensato funciona muitas vezes, como uma peça da grande engrenagem
que sustenta um todo social.
A vaquejada, que alguns dizem querer não
ter existido, cumpriu um importante papel na consolidação e expansão da
interiorização do país. Ajudou a criar e diversificar as manifestações
culturais a ela vinculadas e esteve presente nos processos de socialização dos
grupos migratórios que foram tangidos de seus lugares para outros. Reunidos
entorno de uma prática comum os nordestinos dispersos pelo país encontraram na vaquejada
um elemento de socialização que lhes garantiu por muito tempo a resistência
cultural.
Isso posto é preciso dizer também que
não se pode ignorar o fato de que novos tempos pedem respondas diferentes às
necessidades sociais. Hoje já não se tolera tanto a brutalidade. Além disso,
talvez a vaquejada não seja mais tão importante ao conjunto da sociedade que a
sustentou por tanto tampo. Cai-se então a resistência e a importância que ela
tinha para tantos. Novas necessidades impõem-se. Outras vozes não contempladas
pela cultura do couro de boi e do vaqueiro também pressionam pelo fim de uma
cultura que representa os padrões de uma sociedade que urge ser alterada as
suas fronteiras.
13
de
agosto
Contos Folclóricos Brasileiros - Marco Haurélio
CONTOS POPULARES DO SERTÃO DA BAHIA
RESENHA
HAURÉLIO, Marco. Contos folclóricos
brasileiros. São Paulo: Paulus, 2010. 144 p.
Por Rogério Soares Brito[1]
Em todas as épocas os homens sempre
encontraram bons motivos para ouvir ou contar histórias. As tradições
populares, através de suas variadas manifestações culturais, encarregaram-se de
manter vivas as inúmeras histórias que há tempos persistem no imaginário e são
constantemente recontadas na forma de lendas, fábulas, contos, parábolas e
histórias fantásticas.
Ecos de tempos passados, muitas
histórias encantadoras e maravilhosas, que habitam o imaginário popular, têm
sido exaustivamente estudadas por pesquisadores, historiadores, psicanalistas,
além de inspirarem os trabalhos de escritores, como os irmãos Grimm, grandes
coletores de contos, Charles Perrault, Jean de La Fontaine, Hans Christian
Andersen, Monteiro Lobato entre outros. Marca indelével da cultura popular, a
literatura oral segue o ritmo da espontaneidade do povo, suas crenças,
tradições e festas.
Muitos foram os coletores de contos
populares ao longo da história; seus enredos exóticos e personagens misteriosos
despertam a curiosidade e a simpatia de um público variado, que não consegue
ficar indiferente a essas narrativas. Só para ficar no Brasil, essas narrativas
populares foram o foco de interesse de grandes estudiosos da cultura popular,
entre eles estão Sílvio Romero, Amadeu Amaral, Aluísio de Almeida, Câmara
Cascudo, Henriqueta Lisboa e outros. Porém, esses não são os seus criadores,
elas são criações do povo, manifestações genuínas das capacidades criativas de
populações historicamente marginalizadas.
Esse trabalho de pesquisa ou de
recolhimento das narrativas populares nunca foi pacífico. Alguns estudiosos
modificaram um pouco os relatos que coletaram. Outros simplesmente ignoraram os
valiosos e exemplares conselhos contidos nas histórias e, por excessivo brio
religioso, social ou político, resolveram mutilar os contos, caso do padre
francês Antoine Galland. Responsável pela tradução da obra As mil e uma Noites
para o Ocidente, ele interferiu diretamente na tradução ao deixar de fora
inúmeras narrativas. Acreditava assim preservar as consciências religiosas das
imoralidades que se ocultavam em várias histórias contadas pela princesa
Cheherazade.
Todavia a literatura oral segue viva e
conquistando mais e mais leitores, além de continuar atraindo o interesse de
outros pesquisadores, caso do poeta, editor e folclorista Marco Haurélio, nome
de prestígio no campo de estudo da cultura popular brasileira. Marco Haurélio
tem atuado na linha de frente das ações de valorização e preservação da herança
cultural do nosso povo, pesquisando, escrevendo e divulgando essa tradição
através da literatura de cordel e de livros infantojuvenis que abordam sempre
os temas da cultura popular.
Natural de Riacho de Santana, Bahia,
esse jovem escritor, que em julho completou 36 anos, recolheu, entre os anos em
que viveu na cidade vizinha a sua terra natal, Igaporã, enquanto cursava Letras
na UNEB/Campus VI (Caetité – BA) e lecionava numa escola pública do ensino
básico, uma centena de contos populares, lendas e fábulas, colhidas direto da
fonte mais preciosa, as vozes de anciões sabiamente nutridas pela tradição
popular.
Abertura da seção Contos de encantamento
ou maravilhosos (ilustração de maurício Negro)
O seu mais novo livro, Contos
Folclóricos Brasileiros, editado pela Paulus e ilustrado por Maurício Negro, é
fruto desse trabalho de pesquisa da cultura popular, que desde cedo seduziu o
autor. O livro não traz na íntegra todas as histórias recolhidas pelo autor
durante o período em que viveu em Igaporã, mas apenas algumas das narrativas,
coletadas entre as cidades de Serra do Ramalho, Bom Jesus da Lapa, Riacho de
Santana, Igaporã, Caetité e Brumado.[2] Esse primeiro trabalho será ampliado num
segundo livro, que além dos contos terá lendas e fábulas. Esse segundo trabalho
está com data prevista ainda para este ano, e sairá pela Nova Alexandria,
editora onde o autor trabalha como editor desde que saiu da Luzeiro,
tradicional casa editorial de grandes cordelistas.
Nascido em uma família de trabalhadores
rurais, Marco Haurélio ouviu, desde a mais tenra idade, de seu pai e de sua avó
Luzia Josefina de Farias as deslumbrantes lendas, aventuras, cenas de amores e
lutas religiosas, narradas saborosamente à luz de candeeiros movidos a
querosene. Desse imaginário cheio de exotismo aprendeu as mais ricas e belas
lições da vida em toda a sua maravilhosa diversidade. Dessas vivências é que
ele tira a substância para os seus trabalhos, sempre associados ao universo da
cultura e das tradições populares.
Com 36 contos, as narrativas contidas
nesse livro abordam uma variedade de temas. Vão dos contos de animais em que os
personagens, à moda das fábulas, personificam ações humanas, com fim
moralizante, passando dos contos maravilhosos ou de encantamento onde as
narrativas se desenrolam através das aventuras de personagens na busca de
realizações emocionais, até, como é próprio da tradição cultural popular,
narrativas com motivos religiosos, inspiradas nos evangelhos.
Outros temas, como os contos novelescos
ou de amor e recompensa, contos jocosos ou humorísticos, contos de fórmula ou
acumulativos e os contos de exemplo, completam a recolha. Os amantes das
histórias dos irmãos Grimm e os leitores de Perrault reconhecerão de pronto os
motivos de várias narrativas que aqui foram reincorporadas à tradição cultural
do Nordeste. Uma característica dos contos populares é que eles podem sofrer
transformações ao longo do tempo, porém sua essência é a mesma de um conto remoto,
contado em época e lugar completamente diferente. Isso pode ser exemplificado
pela máxima popular que diz: quem conta um conto aumenta um ponto.
Objetos de entretenimento, distração
despretensiosa, são muitos os usos que se pode dar a essas histórias. O certo,
no entanto, é que as várias narrativas presentes no imaginário popular, e agora
reunidas nesse fabuloso trabalho, servem-se do extraordinário e encantatório,
presentes nas histórias, como adereço à instrução dos homens, de todas as
idades. A sabedoria contida no conto popular é capaz de levar o homem, nas
palavras de Heinrich Zimmer, grande estudioso das culturas antigas, a uma
consciência de si próprio, suas potencialidades, bem como ao reconhecimento de
seus limites.
Despretensiosos em sua linguagem, os
contos recolhidos e recontados por Marco Haurélio seguem fielmente os falares
populares, tão variados e expressivos. Sem prejuízo ao entendimento do conto,
ou ao trabalho de verter das fontes orais, cheias de redundância, para a
escrita os vocábulos próprios e as expressões típicas dos contadores, os contos
recolhidos aqui preservam as nuances idiomáticas que caracterizam a fala do
povo. Veja-se um exemplo: no conto São Pedro e a questão das almas, a certa
altura se lê “São Pedro foi o santo mais teimoso e arteiroso que já
existiu...”. Arteiroso, expressão singular do vocabulário nordestino, aqui
preservada. Familiarizados com essas expressões, os nordestinos, principalmente
os da região onde foram recolhidos os contos, não encontrarão qualquer dificuldade
em entender o significado da palavra. Os leitores de outras regiões terão o
auxílio de um rico glossário atentamente preparado para desbaratar qualquer
dúvida quanto aos significados regionais que abundam nos contos. Nele podemos
ler: Arteiroso, sinônimo popular de teimoso e, em alguns casos, de inteligente.
Fonte inesgotável de saberes, os contos
populares, assim como as lendas e fábulas, são criações inspiradas de
civilizações antigas com o mais elevado propósito: corrigir quando parecem
incorrigíveis as malversações, alertar quando os sinais ainda não são
totalmente visíveis, fazendo vivos erros que, de tão graves e grosseiros, não
deveriam tornar a se repetir.
As distrações que eles promovem, não
escondem as mensagens profundas que são encenadas por animais e outros seres
mágicos, a fim de divertir, entretendo. Jean de La Fontaine, autor francês que
modernizou as fábulas do grego Esopo, quando falou a respeito do propósito de
suas fábulas, disse: “Sirvo-me dos animais para instruir os homens”.
Os contos populares estão ricamente
espalhados por todos os lugares do mundo. Migrando de região em região,
reincorporam elementos sempre novos das várias civilizações por onde andaram.
Puro alimento espiritual de um sem número de povos que, em sua maioria, já não
existem, mas que permanecem vivas, através dos tempos, como testemunhas de
épocas remotas, essas narrativas tradicionais encontraram pouso tranquilo e
morada segura nos rincões “carrascosos” do Brasil, e aqui persistem, graças aos
esforços e ao trabalho de homens como Marco Haurélio.
Essas histórias guardam íntima relação
com aquilo que chamamos de identidade de um povo. Se elas desaparecerem, parte
significativa da memória, sabiamente abrigada por anos no seio de corações
ardentes, some, e com ela, o registro dos hábitos e costumes que compõem as
tradições populares, elo entre o passado e o futuro de uma nação, também
desaparece. Estímulo às consciências, leitura prazerosa, os contos contidos
nesse saboroso livro entretêm, ensinando. Passatempo divertido, os contos
populares também servem de pretexto para reunir os amigos e a família numa roda
descontraída de leitura onde a imaginação cavalga por terras distantes.
Publicado em: Crítica & Debates, v.
1, n. 1, p. 1-4, jul./dez. 2010
[1] Professor Auxiliar do curso de
Letras da UNEB/Campus VI. Especialista em Literatura Comparada em Língua
Portuguesa pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC / 2008).
[2] Cidades baianas localizadas na
região Sudoeste do Estado.
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