O monstro e o homem civilizado


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Há tempos ouvi de alguns amigos, que sofriam com medo da escalada da violência na minha cidade, o pedido de que as autoridades públicas locais, interviessem no caos instaurado e providenciassem soluções imediatas. Para minha surpresa os amigos não pediam mais escolas, mais saúde, mais justiça social para todos. Não lhes ocorriam que a fonte da violência pudesse estar na ausência desses bens às comunidades mais fragilizadas, mas numa suposta degeneração moral de alguns, somente corrigida com o amparo de velhos métodos domésticos. Eles clamavam pela imediata vinda da polícia do cerrado. Queriam o que de mais truculento, torpe e desumano, pode haver em matéria de polícia e se negavam a acreditar em outras alternativas além dessa. A solução sugerida, como visto, era a instauração de uma força policial que todos reconhecem como desrespeitosa dos direitos humanos, mas acredita, mesmo assim, ser esta postura um dado menor, quando está em causa a "restauração da paz e da ordem". Paz à custa de cassetetes e coturnos não é paz. Um Estado civilizado responde as demandas com racionalidade e espirito moderno. Vejam o caso que noticiam hoje os jornais. Vem do norte, a notícia de que uma juíza norueguesa decretou justa, a causa do extremista Anders Behring Breivik que, acusa o Estado Norueguês de lhe implicar um regime prisional desumano. Breivik está em completo isolamento. Desde que sua mãe morreu há três anos ele não tem mais contato com ninguém. Todos vão se lembrar de Breivik, ele está preso por ter assassinado cruelmente 77 pessoas na Noruega em 2011. Fez isso movido pelo ódio de imigrantes e contra o multiculturalismo. De pronto uma onda de intolerância passou a criticar a ação da juíza. Nos jornais os comentários reprovam, peremptoriamente, a ação que deu causa ao pedido do assassino. Invocando uma pretensa justiça que pensávamos superada desde Hamurabe, seguem-se discursos não condizente com quem acredita realmente na paz e na justiça. “Haviam de lhe fazer o mesmo que ele fez aos 77 seres humanos.” Diz um dos que comentam a matéria dos jornais. “...esses facínoras do oriente e do ocidente estão muito acima do nosso fraco poder de exaltar ou de rebaixar... Mata 72 pessoas e ainda é indemnizado! Kkkkkk.”, outro não deixa por menos e emenda. Causa-me espanto que, em pleno século XXI, alguns ainda não entendam que o horror dessa besta humana, não pode ser respondido por uma nação civilizada, com outra força, senão a lei dos direitos humanos que ele ignora e combate. Quando a vida se bestializa, ao ponto de andarmos clamando nas ruas o sangue dos monstros, passamos e nem percebemos aos estados primitivos que nega-nos o direito de sermos chamados Humanos. Ao nos barbarizarmos como aqueles que causa-nos espanto pelo seu comportamento deplorável, descemos como eles ao rés do chão e não podemos pedir justiça, porque esta não entende esse chamado para fazer derramar o sangue de quem quer que seja. Independente do fato monstruoso que ele cometeu, e por mais repugnante e inquietante que possa ter sido o seu comportamento, nada justifica que um Estado civilizado, infrinja seus valores e sua moral para se ombrear com os que querem que o ódio vença todas as causas. Não é uma questão de somenos importância. É por aqui que começa a distância entre um monstro e um homem civilizado.

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