
FELIZ 2010

CACILDA BECKER, 40 ANOS DEPOIS

DIA INTERNACIONAL DAS MULHERES

POR ONDA ANDA O ESTADO CIVIL?
A MAIOR DAS VAIDADES

PREFIRO ANTES O SOSSEGO DA "ROÇA"

A INDISCRIÇÃO DE UM ARTISTA
Há quem se horrorize com esse quadro, já posso até ouvir as suas vozes. Também, não poderia deixar de faltar, há os que façam dessa mesma cena um ato de exploração sensacionalista e maniqueísta, em todos os sentidos, imperdoável. Nunca foi segredo o gosto dos artistas em reproduzirem homens e mulheres assim como vieram ao mundo. A nudez sempre foi muito apreciada na arte, como em alguns lugares inomináveis. Desde os gregos até os séculos mais conservadores essa prática foi aceitável, difundida e reproduzida ad nausea, afinal, era o ideal de beleza e estética que se queria. Mas, um olhar mais profundo sobre essa arte pos-coubertiana, e ela se revelará comedida e muito discreta. Ao figurar as partes pudendas do homem e, da mulher em particular, sempre se teve a preocupação em representar o sexo de forma deturpada, escamoteada e por vezes tristemente fingida. Os homens frequentemente tinham uma discreta folha a cobri-lhe as vergonhas. Enquanto que a genitália feminina não passava da continuidade da pele da barriga, uma representação quase que assexuada. Desse modo, preservava-se a um só tempo, a busca pela perfeição estética, almejada por muitos, e o eterno desejo voyerista que sempre acompanhou o homem, sem ferir as convenções morais, religiosas e sociais, e sem desonrar a sociedade. Gustave Courbet (1819-1877) pintor anarquista francês, dono de um incontido desejo de provocar, dispensou, como se pode ver, qualquer acessório e pintou de forma visceral aquilo que até então era dissimulado nas academias de arte e preservado a custo na intimidade social. Claro está que ele foi acusado de pornográfico, imoral e outros tantos adjetivos desqualificativos que serviram para tornar esse arrogant bastard em mais um pária da sociedade. Sua postura iconoclasta, no entanto, serviu para dessacralizar a falsidade vigente na arte e na sociedade. Além de tudo a tela de Courbet serviu e serve ainda como combustível de um caloroso debate entre os limites entre arte erótica e pornografia. Esse é um debate para próximos post.
O APAGÃO DA CLARO

EMPALIDECER A SOMBRA

CORAÇÃO VAGABUNDO
CORAÇÃO VAGABUNDO
Terminada a minissérie "Maysa - Quando fala o coração", o que se comenta é a disparidade entre o que foi apresentado e a biografia da cantora Maysa - que lhe deu origem. (Quem leu o livro notou). Apesar de ter sido dirigida pelo filho dela, Jayme Monjardim, o que poderia dar ares de parcialidade, a minissérie foi feliz. A meu ver, o diretor afastou-se (sofrivelmente, óbvio) o quando pode da mãe e encontrou-se com a grande artista que foi Mysa.
Tive a grata satisfação de dizer a Lira Neto, jornalista e autor de "Maysa - Só numa multidão de amores" (Edit. Globo) que seu livro é excelente. A obra não traz a história de uma personagem apenas, mas é um passeio pelo universo da melhor música já feita no Brasil. Ninguém ficou de fora. Ainda que não fosse uma grande cantora, Maysa já merecia uma biografia, porque se trata de uma mulher íntegra, mas ao mesmo tempo transgressora, uma odiada, uma agredida, uma Janis Joplin, alguém que fez da vida o que bem quis -- o que talvez explique suas fossas e sua irremediável solidão.
A cantora, em início dos 60, por exemplo, já famosa, flertou com a recém-nascida Bossa Nova, que ganharia, pouco tempo depois, adeptos como Nara Leão, por exemplo. Algumas das interpretações de Maysa , sereníssimas, do tipo "pois há menos peixinhos a nadar no mar / do que os beijinhos que darei na sua boca (...) dentro dos meus braços / os abraços" (Chega de Saudade) ou então "o barquinho a deslizar, no macio azul do mar / céu tão azul, tudo isso é paz / tudo isso traz / uma calma de verão (...) a tardinha cai" (O Barquinho), contrastam -- e muito -- com o seu temperamento explosivo e amargo, de mundo caindo e garrafa voando.
Maysa Figueira Monjardim Matarazzo (principalmente Matarazzo) foi cantora de sucesso, como já vimos, embora seja pouco lembrada como compositora. Revelou-se com o samba canção "Ouça", dela, em fins da década de 50. Suas letras -- analisadas com toda seriedade -- não são extraordinárias como, por exemplo, as de sua amiga Dolores Duran, a autora da maravilhosa "A Noite do Meu Bem", canção que, inclusive, fora gravada por Maysa. As letras dela não são geniais, mas também não são supérfluas. Trazem a sua angústia, sua tristeza, sua inquietação interior. Ela jogou em seus inúmeros diários a mesma substância que sua contemporânea Clarice Lispector lançou em seus livros. Trata-se de um universo particular -- porém admirável.
Maysa fora vítima de seus próprios excessos. Viveu quarenta anos. Sua coleguinha (e arquiinimiga) Elis Regina, outra que se foi tragicamente, viveu trinta e seis.Esse pessoal não dura muito. Maysa fora infinita enquando viveu. A melhor interpretação para o clássico "Ne me quitte pas" (Jacques Brell), um mundo dentro de uma pessoa que ousa cantá-la, ainda é o da brasileira Maysa. Ela foi parar, inclusive, no filme "A lei do desejo" (1987), de Pedro Almodóvar, com Antonio Banderas. (Alguém aí viu?). A mulher que cantava "só digo o que penso / só faço o que gosto" era alcóolatra, e faleceu em janeiro de 1977, num acidente estúpido, que deixou sua brasília azul em petição de miséria. A perícia analisando o cadáver, constatou que ela morrera sem uma gota de álcool no sangue. Para tapar a boca daqueles que um dia a difamaram, dos que queriam vê-la pelas costas, daqueles que invejaram sua mansão e seu prestígio, dos que a sepultaram em vida. Até na hora da morte Maysa se manteve digna.
Por essas e outras é que Maysa não fora qualquer uma.
A AMÉRICA VISTA DE FORA... E DE DENTRO?
Então fala-me lá de sua temporada na América. Que impressões, marcas e sentimentos esses dias lhe revelaram. Vista de fora a América e os americanos desperta-nos, como você mesma provavelmente já sentiu, sentimentos ambíguos irreconciliáveis. Se de um lado vibramos e exaltamos seu exemplo de superação tão bem ilustrado nos últimos dias com o novo presidente. De outro, condenamos a paixão dominante dessa nação em adquirir todos os bens desse mundo, a qualquer preço. Quando os homens, afirmava Tocqueville, não estão ligados entre si de maneira sólida e permanente, não é possível conseguir que um grande número deles aja em comum, a não ser que se persuada cada um daqueles cujo concurso é necessário de que seu interesse particular (grifo aqui de negrito essa frase porque penso que é esse o valor mais difundido na América e por extensão ao resto do mundo) o obriga a juntar voluntariamente seus esforços aos de todos os outros; na esperanças de um mundo verdadeiramente justo e fraterno. A desagregação dos valores, a lassidão nos negócios, o desrespeito às diferenças, as imposições e violência da América ao resto do mundo, ofusca muito de suas qualidades, notadamente muito esquecidas nos últimos anos. Não há nada, à primeira vista, menos importante aos americanos do que a consolidação de sua liderança no resto do mundo, arranhada pelas recentes trapalhadas de Bush pai. Portanto, minha cara amiga, não comungo, com a opinião corrente, de que a ascensão de um novo presidente, tão coberto de louros, mudará os rumos da política expansionista dessa nação. Já vimos algo muito parecido com isso por aqui. Conte-me você como sente as mudanças que prometem abalar as estruturas do mundo.